Uma breve análise do herói Werther de Goethe. Barbara Michele Murtha Passos

14/06/2012 13:04

 

Uma breve análise do herói Werther de Goethe.

 

O romance Os sofrimentos do Jovem Werther de Johann Wolfgang Goethe foi publicado na Europa em 1774 e causou um grande impacto entre os jovens da época, desencadeando uma grande onda de suicídio. Tamanha foi a repercussão, que alguns governos tentaram impedir a circulação da obra.

 Marco inicial do romantismo, considerado por muitos como uma obra-prima da literatura mundial, é uma das primeiras obras do autor, de tom autobiográfico - ainda que Goethe tenha cuidado para que nomes e lugares fossem trocados e naturalmente, algumas partes fictícias acrescentadas, como o final.

Neste livro, o suposto Jovem Werther envia por um longo período cartas ao narrador que, no próprio livro, através de notas de rodapé, afirma que nomes e lugares foram trocados.

romance é escrito em primeira pessoa e com poucas personagens. Na época ocorreu, na Europa, uma onda de suicídios, de tão profundo que Goethe fora em suas palavras. Num estilo completamente adverso a Fausto, mas não menor que neste. (Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Os_Sofrimentos_do_Jovem_Werther).

 

A história de Werther retrata a paixão exacerbada e infeliz que culmina com o suicídio do herói. A obra caracteriza bem o espírito romântico; o amor incondicional, idealizado, o escapismo. A história é contada através de cartas endereçadas ao amigo Wilhelm, em que Werther descreve seu amor por Charlotte, mulher comprometida com seu antagonista Albert, com quem viria a se casar, para desespero do herói.

O romance é introduzido por dois breves parágrafos, cujo narrador, onisciente, não é identificado, mas que advertem e causam grande expectativa no leitor em relação às amarguras sofridas pelo herói.

“Reuni tudo o que me foi possível encontrar sobre a história do pobre Werther, e aqui lhes apresento o resultado dessas buscas, certo de que me agradecerão por isso”. “Não poderão de admirar seu espírito e caráter, derramando lágrimas por seu triste destino.”

“E você, boa alma, que sofre as mesmas amarguras que ele, console-se com seus sofrimentos, e que este pequeno livro, lhe seja um amigo caso não possa encontrar, por força do destino ou por sua própria culpa, alguém que alivia sua aflição”.

 

Feita a breve introdução, a obra é toda narrada em primeira pessoa, sempre por Werther. As cartas ao camarada Wilhelm são datadas de 4 de maio de 1771 a 6 de dezembro do mesmo ano.

No início do romance, o jovem herói de Goethe está feliz, embora longe de casa e de seu grande amigo, e escreve sua primeira carta, contando sobre um caso amoroso mal resolvido e alguns negócios de sua família. Em suas primeiras cartas, Werther segue relatando esses primeiros dias tranquilos, descrevendo as singularidades da sociedade local, das pessoas simples do povo aos eruditos.

A maior parte da trama desenvolve-se em Wahlheim, lugarejo do interior da Alemanha, para onde Werther parte em busca de trabalho.

Trechos da primeira carta escrita em 04 de maio:

“Sinto-me feliz por ter partido! O Coração do homem, meu caro amigo, é um mistério indecifrável!

Deixá-lo, uma pessoa a quem tanto estimo e de quem era inseparável, e mesmo assim estar feliz!...

Pobre Leonorre! E, no entanto não tive culpa. Que poderia eu fazer se, enquanto me distraia com a graça sedutora de sua irmã, uma paixão desabrochava em seu peito?”...

“Por favor, diga à minha mãe que não descuidarei de seus negócios, e que lhe mandarei rapidamente alguma notícia”...

 

Werther revela o abismo entre o desejo de uma vida intensa, livre, e as exigências de um mundo exterior marcado por regras sociais que sufocam seus sonhos.

O romance passa por diversos temas; a relação entre arte e natureza, o afastamento da burguesia em relação às pessoas comuns, a paixão pela poesia, os preconceitos de classe e estamentais e a força de um amor intenso e aniquilador.

O leitor entra em um mundo que vai das anotações tranquilas de um jovem que está vivendo no campo, contemplando a natureza que o cerca em seus devaneios solitários, suas reflexões sobre coisas do mundo, sobre os camponeses, as plantas, até o completo encantamento por Charlotte, que pode ser vista como a metáfora da morte, do sofrimento que o amor não correspondido implica.

O herói de Goethe é um jovem muito inteligente, afetivo, com grande interesse pela leitura, pelas coisas da natureza e pela vida social do lugarejo que o cerca, mas não encontra lugar no mundo que assegure sua pureza de espírito. (Retirado do comentário sobre a obra, Abril Coleções).

Trecho da carta escrita em 12 de maio.

“Não sei se espíritos enganadores pairam sobre este lugar, ou se é meu coração que está ardente a celeste fantasia que fornece uma atmosfera. A entrada do vilarejo há uma fonte, à qual estou ligado por um encantamento, como Melusina e suas irmãs”...

A natureza adquire especial significado no mundo romântico. Testemunha e companheira das almas sensíveis é também refúgio e proteção, mostrando-se uma personagem importante na trama.

Werther projeta seus sentimentos e impressões pessoais na natureza, o que é uma forte característica do Romantismo e indiretamente traça um paralelo entre as Tílias de Wahlheim e o seu inditoso destino.

“Sim, é assim mesmo. Assim como a natureza anuncia o outono, o outono começa em mim e ao meu redor. As minhas folhas amarelam, e as folhas das árvores vizinhas já caíram”.

 

Outro ponto marcante do Romantismo é a idealização feminina. A mulher era fonte de toda inspiração; intocável, vista como um anjo de cuja pureza não se pode desfrutar. Charlotte era, para Werther, uma mulher sem defeitos.

Trecho da carta escrita em 16 de julho:

[...] “Ela é sagrada para mim. Todos os meus desejos emudecem em sua presença. Quando estou a seu lado, nunca sei o que sinto. Tenho a sensação de que minha alma se expande por todos os nervos. Há certa melodia que ela dedilha no piano com expressão de um anjo, tão simples e tão encantadora!...É sua área predileta; logo que ouço a primeira nota, tem sobre mim o benefício efeito de afugentar mais mágoas, incertezas e preocupações”.

 

O herói de Goethe não se acanha em expor suas emoções pessoais, em fazer delas a temática sempre retomada em suas cartas.

“Wilhelm, que seria para nosso coração o mundo sem amor? O mesmo que uma lanterna mágica sem luz. Mal introduzimos nela a pequenina lâmpada, e surgem na parede as mais variadas imagens. Embora sejam apenas imagens fugazes, são elas que nos fazem felizes quando ficamos ali, como crianças, extasiados diante das maravilhosas aparições”.

No auge da narrativa, quando Werther não suporta mais sofrer por seu amor não correspondido, e o leitor acha que o desfecho se aproxima, entra uma nota de um editor, que toma de Werther para si a narrativa do Romance.

 Quem então será a pessoa que retira a narrativa de Werther? Wilhelm testemunha de seu sofrimento?

Do editor ao leitor:

“Desejaria muito que nos tivessem ficado, dos últimos e significativos dias da sua vida de nosso infeliz amigo, testemunhou escritos por ele próprio, para que eu não visse obrigado a interromper a série de cartas que ele nos deixou. [...] Esforcei-me para obter detalhes com pessoas que podiam estar bem informadas acerca de sua história”.

Obs.: Dizem que esta obra tem um tom autobiográfico. Goethe tomou cuidado para que nomes e lugares fossem trocados.

   A identidade desse narrador fica por conta do leitor.

Quando Werther, acompanhado da desesperança, sucumbe ao chamado da morte, que passa ser a sua companheira desejada, como toda sua esperança em ter seu amor se vai, o herói desiste de sua vida. Sem Charlotte sua vida não tem mais sentido.

 Trecho da carta escrita por Werther a Charlotte. (última carta antes do suicídio):

 

[...] “Há apenas um número de homens generosos a quem foi dada a honra de derramar seu sangue pelos que amavam, e permitir a eles, por intermédio de sua morte, uma vida fecunda”.

[...] “Já estão carregadas... É meia-noite: que o meu destino se cumpra!

Adeus, Lotte! Adeus!”

 

Albert, noivo de Charlotte, ocupando o papel de antagonista, não só entra na história para desencadear o triste idílio do jovem Werther, mas também e principalmente como para contrastar sua personalidade com a do protagonista - um contraponto no triângulo amoroso. Albert é um homem elegante, de bons modos, extremamente prático e que, ao contrário de Werther, encontra-se confortavelmente modelado pelas regras e valores de seu grupo social. Não é por mero acaso que Werther pede a Albert, a pretexto de uma caçada, a arma com a qual se suicidaria.

O protagonista não é apenas o amante infeliz que, em seu desespero, ruma ao encontro da natureza, ele é também o cidadão cujo espírito se debate com a opressão imposta pelos valores e regras rígidas e injustas que determinam o modo de vida de seu grupo social. Com sua carga de sentimentalismo, o embate interior com a vida social e seu olhar amoroso para a vida popular o Herói rastreava todos os temas que marcariam sua época, expondo a “dor do mundo” de toda geração de jovens do Romantismo.

[...] “Werther morreu ao meio-dia. [...] Alguns trabalhadores levaram o caixão. Nenhum sacerdote o acompanhou”.

 

 

 

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